segunda-feira, 1 de junho de 2009

Austrália é um filme de Baz Luhrmann (Romeu e Julieta; Moulin Rouge) que considero um realizador altamente estimulante. Pois meus senhores se querem regressar aos grandes clássicos do cinema, àqueles filmes que só se podem ver na sala escura de um cinema, que sabem contar linearmente e sem pseudo-intelectualismos uma história com grandeza, sensibilidade, emoção (quem não se emocionar já se deixou vencer pelo cinismo), simbolismo, encanto, sem velocidades loucas nem golpes de efeitos especiais sem nexo não podem perder esta pérola, esquecida pelas audiências americanas e europeias e trucidada por críticos de mal com a vida.
É o regresso (?) arrebatador do verdadeiro grande cinema americano que, no passado, o elevou a líder da indústria cinematográfica mundial. Grandes interpretações, banda sonora bem integrada, realização audaz e segura estão ao serviço de uma história de diálogo de culturas, de busca interior, de renovação de vida, da força salvadora e redentora do amor do amigo, do amor homem-mulher, do amor maternal, do amor de filho, do amor a um país.
Dizia a certa altura a criança protagonista: “Contar histórias é o mais importante de tudo; é assim que guardamos sempre as pessoas que nos pertencem”. É por isso que não me canso de recordar e recontar e reviver as muitas histórias da minha vida… Como esta de voltar a falar de Austrália. Um filme obrigatório.

Nota: 10

Dúvida

O filme "Dúvida" foi realizado pelo mesmo autor da peça teatral que está na génese da referida película: John Patrick Shanley. Antes de mais é preciso dizer que não estamos diante de um grande filme, nem me parece que fosse essa a intenção do seu autor. Estamos sim diante de uma portentosa interpretação de dois actores consagradíssimos (e por quem sou um apaixonado): Meryl Streep e Philip Seymor Hoffman. E por uma não menor performance de uma surpreendente Amy Adams e de uma tão esquecida Viola Davis. Só por estes quatro já vale a pena o preço do aluguer ou da compra do dvd.
A peça desenrola-se em 1964, num colégio católico no bairro de Brox, e aborda a questão dos abusos sexuais cometidos pelo clero, o confronto de uma posição conservadora frente a uma nova perspectiva cristã que daria origem ao Vaticano II e, principalmente, a questão da dúvida que toda a fé e toda a decisão implica.
A reitora, interpretada por Streep, é uma freira dura, resoluta e desconfiada de tudo o que é novidade. Uma imagem que todos guardamos na memória. Mas será ela que manifestará, por detrás de toda aquela austeridade, um humor fino, uma verdadeira compaixão humana, uma corajosa fidelidade a Cristo que a leva a desafiar o argumento hierárquico da autoridade e uma crente fragilidade que a levam a derramar lágrimas acompanhadas da palavra repetidamente pronunciada: "dúvidas, tantas dúvidas". Mais que dúvidas da culpabilidade do sacerdote, são as dúvidas de uma crente diante do mistério mais difícil da fé professada pelos católicos: a fé na Igreja, na sua dupla realidade carismático-institucional, na sua contraditória história passada e presente, no tremendo abraço dorido e apaixonado que ela exige em volta de si própria.
Assim, estamos diante de um bom filme, com um naipe da actores insuperáveis e que, sem maniqueísmos, apresenta o constituinte fundamental de qualquer fé: a dúvida.

Nota: 7

O Estranho Caso de Benjamin Button

David Fincher tem no seu currículo filmes marcantes como Seven (1995), O Jogo (1997), e, principalmente, Clube de Combate (1999) e Zodiac (2007). E outros menos bem conseguidos como Sala de Pânico (2002) e esta super nomeada e super desilusão oscariana história de Benjamin Button. Tenho pena que o filme falhe narrativamente, se banalize na sua progressão ao longo da história do século XX, se trivialize na sua fotografia turística e nas opções fáceis para impressionar. Ainda por cima é muito longo e sente-se essa longevidade. E tenho pena porque além de excelentes actores (caracterização, montagem, efeitos especiais), o filme tem uma lindíssima reflexão sobre o envelhecer, tem um olhar crítico e reflectido sobre o mito (tão actual) da eterna juventude, da vontade de parar o tempo, de negar as marcas do tempo no nosso corpo e no nosso espírito.
Como devem saber, no filme Button nasce velho e ao longo da vida vai-se tornando cada vez mais novo até terminar numa infância sem memória e num bebé inexpressivo. Ele tem o tempo fechado, contado sem a incerteza, a abertura do homem comum. Este envelhecendo não deixa de tentar alcançar os seus sonhos nem de sonhar (ver no filme a personagem Tilda Swinton), recorda e conta a sua história e com ela aprende e ensina, vive a vida como um dom que se entende quando começa mas se oferece quando acaba, pode sempre recomeçar porque o caminho inexorável do tempo não o impede de arriscar porque o futuro é indefinição.
Assim e apesar da desilusão cinéfila, saí do cinema satisfeito porque envelhecer, mais que uma fatalidade é a grande oportunidade que temos de não deixar de acreditar na possibilidade de realizar as nossas utopias. Aliás, as grandes lições que tenho recebido ao longo da vida têm sido dos mais velhos. E grande parte do meu amor vai para alguns homens e mulheres que já cá vivem há algum tempo e de quem tanto dependo. Mas como estamos aqui para falar de cinema e não só de argumentos nem da nossa história pessoal, reafirmo a minha desilusão com este objecto cinematográfico: foi uma oportunidade perdida.

Nota: 6